sábado, 17 de abril de 2010

Eu muleto (uso muletas), para me recuperar ou para sobreviver?

Era uma vez, em uma conversa logo após minha chegada em São Paulo, uma moça, já não tão moça assim, que sofrera um acidente - no intervalo de 4 horas, a moça teve duas quedas. O resultado da primeira queda foi uma dor aguda e inchaço no tornozelo, da segunda um joelho cortado e inchado. (não sei se a ordem das quedas está correta, mas...). Resultado final, a moça, não tão moça assim, não conseguia andar.

Bom, minha primeira reação, por que eu sou um doce de pessoa e adoro me doar, provocar alívio de dor e etc e tal, foi de massagear a moça, enquanto tentava descobrir se algo emocional tinha provado os acidentes...

Fiz massagem dos pés a cabeça... e ouvi a história das quedas:
"Minha mãe queria que eu fosse ao lugar x (eu não lembro o lugar), e eu não queria ir... mas pra evitar encheção  de saco eu fui, aí quando estava no lugar y, caí, do nada! E machuquei... Depois, com muita dor, minha mãe, queria que eu fosse no lugar w, e eu com muita dor disse que não iria, e ela praticamente me puxou pelo braço, me forçou a subir no ônibus, que fez a dor aumentar muitíssimo, e ela nem se incomodou... bom, eu fui né, fazer o que, não ia descer no meio do caminho com aquela dor! (pausa). O fato é que, quando chegamos no lugar w, caí de novo! e fiquei ali estatelada, e minha mãe riu, e sequer se dignou a me ajudar! Foi assim que eu me machuquei, caindo de madura, sem nada demais pra provocar as quedas..."

Nessa altura a massagem já tinha chegado à face de minha interlocutora, e eu ouvindo, enquanto matutava com meus pensamentos, o que de fato minha "paciente" estava dizendo...

Eu me gabo, dizendo que tenho interpretação analítica, e portanto, compreendo o que não foi dito e revelo...

E a "revelação" deste trecho da conversa foi simplista: Minha mãe é meu algoz. Ela judia de mim. Ela não me ama! Como eu queria que alguem se importasse comigo e não me provocasse dor! Pensa mal dela, por favor!
E depois, para finalizar, na frase final, ela se justifica, quando diz que caiu de madura, que ela não tem "culpa/responsabilidade" alguma, sobre a queda, foi o universo que decidiu, foi a mãe dela quem decidiu que ela receberia as dores...

Cenas como esta, me rodeiam o tempo todo, e eu acho que tenho a missão de dizer o que me foi "revelado", dar a informação, e tirar do interlocutor a chance de dizer: "eu não sabia". E de fazer o que quiser com a informação recebida.

No caso acima, perguntei à moça: Por que você foi? Por que não disse não?
Você entende que não fazer uma escolha, implica em uma escolha?
Sua mãe não é má, como você tentou transparecer, ou talvez até seja, mas de fato, seu grande algoz foi voce mesma. Você optou por ir onde não queria, você optou por não ouvir o grito da primeira queda, dado pelo seu corpo, dizendo "Por favor! Não vá!".

Preferiu ignorar seu corpo, sua mente, seu gosto e aceitou o desgosto. Aceitou martirizar-se.

Será que para você, a vantagem não seria então fazer com que o mundo concluisse com sua historia, que você tem um algoz que te faz submissa e torturada, mesmo nas piores condições físicas? Sem pena ou compaixão alguma... Será, que você não está adotando o martírio, e colocando o chicote nas mãos de outros para se desculpar, justificar, ou ainda, para obter alguma atenção?

É óbvio que meu tato e timing são extremamente falhos e agressivos. Eu assumo....

Mas, a história acima me fez pensar nas muletas, físicas e psicológicas, que usamos, e nas motivações que impulsionam este uso.

Na minha cabeça, a formulação é óbvia (repito, na minha cabeça!): Não estamos acostumados a escolher. Não temos consciência de nossas ações, nem de nossas escolhas.
Ora por que não queremos, ora por que não precisamos, ora por que não sabemos.

Seja o motivo que for, acho que sai muito caro pensar que o nosso algoz mor, somos nós mesmos!

Adoecemos para obter atenção, mas morremos no processo.
Nos machucamos como a moça acima, colocamos o outro na posição de algoz, culpamos, mas, doemos muito no processo...

Será que estaremos aptos algum dia à não criar um "diabo" pra receber as culpas dos nossos "pecados"?

Será que isso é influencia da educação cristã, que nos obriga à sermos bonzinhos, e a nos considerar maus, quando não somos aceitos, atendidos ou amados...

Não sei, ainda repenso...

Um comentário:

  1. Adorei o post! As pessoas (todo mundo) criam muletas e colocam a culpa a algo externo a elas o tempo todo... às vzs sem perceber né...
    Eu procuro observar isso em mim pra não deixar isso dominar... e quando acho q me cabe, falo isso pra pessoa q faz o mesmo.

    Beijo Circe!!!

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